quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Congadas de Itamogi, Paraíso e região têm raízes negras e europeias

 
Congadas em Itamogi, Minas Gerais: hierarquias se desfazem como pó


Tchi, tchi, tchi, tchi, bum, tchi, tchi, tchi, tchi, bum. O som da caixa é inconfundível e serve de senha. O terno de congo está chegando com sua miscelânea de cores, sons e ritmos, mesclando os valores culturais e religiosos vindos da mãe África, a bordo dos tristes navios negreiros, com os valores católicos trazidos pelos portugueses.  Uma das mais importantes manifestações que contribuíram para firmar a mestiça identidade nacional, embora não tão valorizada e lembrada como o samba ou a capoeira, as congadas estão esparramadas por todo o Brasil,  acontecendo, aqui e ali, em determinada  época do ano e celebrada com características próprias, dependendo das peculairidades regionais que adquiriram.
As origens das congadas são matéria de controvérsia entre pesquisadores. Uma corrente identifica sua fonte em uma tradição africana, em torno da coroação dos reis do Congo, embora outroas vertentes acreditem que a matriz esteja em Angola. De qualquer modo, a tradição, de tão forte, atravessou o Atlântico e se instalou no coração das senzalas, dos quilombos e de outras comunidades negras no período colonial. Em terras brasileiras, seria uma forma de os escravos reafirmaram suas origens, sua identidade, sua fidelidade aos antepassados.
Como ocorreu com outras expressões culturais e religiosas, as Congadas evoluíram em função do sincretismo que proliferou no período colonial e monárquico. Às raízes africanas foram somadas  as influências católicas europeias e as congadas passaram a se tornar momentos de homenagem a santos de grande simpatia e empatia populares, como Nossa Senhora do Rosário e São Benedito.
Depois vieram os cultos, durante as congadas, a outros santos queridos, como Santa Ifigênia, Santa Catarina, São Jerônimo e São Domingos. Ecos de tradições europeias também são ouvidos em algumas sonoridades e no enredo das Congadas, que teriam incorporado situações ligadas aos reis Fernando e Isabel, da Espanha,  e/ou de Carlos Magno e os 12 pares da França, ou mesmo as cruzadas contra os mouros na Península Ibérica. De fato, existem traços de combates simulados em algumas modalidades de Congadas, em referência às fontes africanas ou europeias.
Sons fortes, batidas pesadas, marcam o compasso dos ternos, os grupos que se reúnem para desenvolver as Congadas. São os sons vindos dos pandeiros, cuícas, reco-recos e, sobretudo, das caixas de congo, espécie de tambores que geralmente vão à frente dos ternos. Impossível não se contagiar com os batuques que evocam o imaginário mestiço, plurirracial, que moldou a alma brasileira. Mas instrumentos de corda também estão presentes, compondo uma sinfonia de sons e ritmos que convida para a dança, inclusive em algumas festas do Divino, nas quais estão presentes modalidades de Congadas.
Em todos os pontos do Brasil, onde as Congadas continuam firmes, resistindo à massificação cultural,  as festividades cumprem papel semelhante ao do Carrnaval. São momentos de celebração da liberdade e da vida, como ocorria nos eventos originais - os senhores de engenho davam "permissão" para os escravos celebrarem o cortejo dos reis congos durante um dia específico. Era, óbvio, uma data muito esperada e comemorada. As celebrações também dependiam, no caso de ocorrerem  em espaços urbanos, da autorização das autoridades policiais.
As Congadas contemporâneas mantêm, em linhas gerais, o enredo das fontes. Os "congadeiros" cantam as músicas em louvor aos santos, dançam passos com nítida inspiração africana e, em determinadas ocasiões, fazem o transporte dos reis congos, um casal que é escolhido como "majestades" para liderar as festividades. Os reis congos são então acompanhados pelas ruas até sua entrada nas igrejas. Geralmente os reis congos, devidamente vestidos com indumentárias brilhantes, são abrigados sob guarda-chuvas ou outros aparatos protetores. Tudo para salientar a sua realeza. A coroação dos reis congos é momento forte.
Outro momento forte dos cortejos é o das chamadas "embaixadas", que seria uma referência às embaixadas enviadas entre as cortes africanas - embaixadas de paz ou de guerra. Não por acaso, os ternos são geralmente conduzidos sob a batuta de "generais" e "capitães", além, é claro, dos próprios reis congos. Em algumas localidades também acontece o levantamento das bandeiras em homenagem a determinados santos, que se constitui na solenidade que abre oficialmente as congadas daquele ano. Com efeito, as festas das Congadas apenas são encerradas, nesses locais, quando acontece a descida das bandeiras, que ficam instaladas no centro nervoso onde ocorrem as festividades.
Existem Congadas espalhadas por todo o território brasileiro, mas em algumas comunidades elas adquiriram força especial, atraindo a cada ano os moradores locais e também turistas. São os casos de Pirenópolis e Catalão, em Goiás, de Cametá, no Paraná, e de várias cidades mineiras, como Uberlândia, São João del-Rei, Machado, São Sebastião do Paraíso e Itamogi. Desses locais, em especial do sul de Minas, as Congadas foram levadas pelos migrantes mineiros que se estabeleceram nas periferias de grandes cidades, como São Paulo e Campinas. O tradicional Festival do Folclore de Olímpia, no interior paulista, é um momento especial de apresentação de congadas de todo país.
As Congadas incluem, de acordo com a tradição, a apresentação de grupos com funções específicas, como os vilões, os marujos, os catupés, os próprios congos e os moçambiques. Os moçambiques, em particular, seriam os "anjos" que abriam caminho para os acompanhantes dos reis congos. Em algumas regiões, os moçambiques passaram a constituir "ternos", ou grupos próprios, como em São Sebastião do Paraíso e Itamogi, no Sul de Minas. Nesses casos, a indumentária dos "moçambiqueiros" difere dos "congadeiros". Os "moçambiqueiros" são trajados de saias e portam espécies de guizo nos pés, acentuando sua sonoridade própria durante as danças e cantos.
Como em toda grande festa de caráter popular, cultural e religioso, as congadas também são sinônimo de culinária pesada. Em algumas localidades permanece a tradição de oferecimento de farta comida e generosa bebida por parte dos "festeiros", pessoas das comunidades que assumem esse encargo. Em outros locais essa tarefa passou à esfera do poder público, com muita, mas muita comida servida, e de graça, para quem quiser. Em Itamogi, a macarronada com batata é servida com muita generosidade para os "congadeiros", os "moçambiqueiros" e o povo em geral, nos quatro dias da tão esperada festa, que é o emblema da identidade local.
A exemplo de outras legítimas manifestações culturais e religiosas, as Congadas também sofreram mutações inevitáveis em função das mudanças profundas na sociedade brasileira,  como no caso da transição de um mundo essencialmente rural para um universo urbano. Para muitos as raízes estão perdidas no passado, ameaçadas por interesses políticos e econômicos que passaram a envolver muitas das festas da alma brasileira. Mas os sinais originais, os ecos da Mãe África e igualmente das influências europeias, continuam presentes, sempre a encantarem e a seduzirem pelo mosaico de sons, ritmos, cores e sabores que ainda vestem, com realeza e fidalguia, as Congadas, momento mágico em que as hierarquias se desfazem como pó.  (Texto do livro "Imagens do Brasil - A alma plural e única do Brasil", Volume 1, de José Pedro Soares Martins, Editora Komedi, Campinas, 2010)

Região Metropolitana de Campinas sem perspectiva de mapeamento digital, previsto para Aglomerados de Jundiaí e Piracicaba


Avenida Francisco Glicério, centro de Campinas: RMC demanda "visão compartilhada" que está sendo observada na região metropolitana do Vale do Paraíba


Os Aglomerados Urbanos de Jundiaí e Piracicaba terão mapeamento digital, conforme decisão da Secretaria de Desenvolvimento Metropolitano de São Paulo. O mapeamento já havia sido executado na Região Metropolitana de São Paulo e está em curso na mais nova região metropolitana paulista, a do Vale do Paraíba e Litoral Norte. Ainda não há perspectiva de mapeamento nas regiões metropolitanas de Campinas e Baixada Santista.
O mapeamento digital visa a configuração das Unidades de Informações Territorializadas (UITs), contendo dados sobre perfil urbano ou rural, atividades socioeconômicas, demografia e outros. O propósito é subsidiar o planejamento e a formulação de políticas públicas.
A estruturação da Região Metropolitana do Vale do Paraíba e Litoral Norte, a mais nova do estado,  instituída pela Lei Complementar no 1.166, de 9 de janeiro de 2012, vem ocorrendo de forma diferente das demais regiões metropolitanas. O governo de São Paulo promoveu, por exemplo, uma consulta pública para avaliar o potencial de desenvolvilmento da RMVale.
O objetivo da consulta, segundo o governo paulista, foi "abranger a diversidade de entendimentos e de características existentes nos 39 municípios da Região Metropolitana. O que se deseja é construir uma visão compartilhada com diversos atores quanto à perspectiva de desenvolvimento da Região".
Pois essa visão compartilhada também deveria ser estendida às regiões metropolitanas de Campinas e Baixada Santista. A mudança de prefeitos em janeiro de 2013, levando a modificações nas configurações dos Conselhos de Desenvolvimento das metrópoles, constitui excelente oportunidade para a ampliação da participação da cidadania nos processos de organização dessas áreas. A ampla participação cidadã será essencial para a própria governabilidade da chamada Macrometrópole Paulista, constituída pelas regiões metropolitanas e aglomerados urbanos já criados. (José Pedro Martins)   

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Região de Campinas mantém baixo desempenho em gestão ambiental no Programa Verde Azul


Campinas melhorou posição, mas teve um desempenho muito baixo em gestão ambiental nas cinco primeiras edições do Programa Verde Azul, das quais participou de apenas três

A Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo divulgou na terça-feira, dia 18 de dezembro, a lista de 134 municípios (dos 371 participantes na edição de 2012) que conseguiram nota superior a 80 e foram reconhecidos como municípios exemplo na área ambiental, certificados pelo Programa Município Verde Azul. Cinco municípios da Região Metropolitana de Campinas (RMC) estão entre eles, sendo Vinhedo o primeiro a aparecer, no lugar 61 do ranking, com nota 87,15. Os demais são Americana (68 no ranking, nota 86,02), Indaiatuba (69, nota 85,97), Paulínia (73, nota 85,76) e Jaguariúna (132, nota 80,07). Campinas apareceu no lugar 231 do ranking, com nota 57,77, melhorando sua posição em relação aos anos anteriores, mas ainda com baixo desempenho, pelos critérios do Programa Verde Azul. A RMC manteve então em 2012, de modo geral, um baixo desempenho em gestão ambiental, verificado nas cinco edições do Verde Azul, pelos critérios do programa do governo estadual.
Os dez primeiros colocados no ranking de 2012 foram: Botucatu (nota 97,26), Sorocaba, Araraquara, Fernandópolis, Santa Fé do Sul, Taquarituba, Angatuba, Cajobi, Quadra e São José do Rio Preto (nota 93,57). O Programa Município Verde Azul foi lançado em 2007, visando  descentralizar a agenda ambiental paulista. No primeiro ranking, em 2008, 44 municípios atingiram nota igual ou superior a 80. Em 2009, foram 168. Em 2010, 144 municípios. Na edição de 2011, 159 receberam a certificação.
Os municípios recebem uma nota ambiental, considerando  o seu desempenho em dez diretivas do Programa Município Verde Azul: esgoto tratado, lixo, recuperação da mata ciliar, arborização urbana, educação ambiental, habitação sustentável, uso da água, poluição do ar, estrutura ambiental e conselho de meio ambiente.
De acordo com a Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo, depois de cinco anos de programa hoje o estado conta com: 155 municípios elaboraram o Plano de Resíduos Sólidos; 410 municípios com coleta seletiva de resídiuos; 539 Secretarias Municipais/Departamentos/Divisões de Meio Ambiente;  567 Conselhos Municipais de Meio Ambiente deliberativos e 280 municípios com Fundos de Meio Ambiente; Articulações intermunicipais ambientais em Educação Ambiental (204 municípios) e Recuperação de Mata Ciliar (144 municípios); 205 municípios com parcerias entre prefeituras e pessoas físicas ou jurídicas; 318 municípios com Capacitação de Professores da Rede Municipal em educação ambiental; 335 municípios com Centros de Educação Ambiental; 261 municípios com Ciclovias; 276 municípios com Planos de Arborização Urbana; 361 municípios com Viveiros.
No ranking de 2011, a RMC teve os mesmos cinco municípios de 2012 entre 159 municípios com nota superior a 80: Jaguaríúna (55 no ranking, nota 87,10), Indaiatuba (97 no ranking, nota 83,81), Americana (112, com nota 82,88), Vinhedo (123, nota 81,81) e Paulínia (135, nota 81,07). Campinas figurou no lugar 564, com nota 13,78. Em 2010, Americana apareceu no lugar 75, com nota 84,25, seguindo-se  Vinhedo (121, nota 80,96) e Indaiatuba (139, nota 80,21), entre os 144 municípios com nota superior a 80. Campinas apareceu no lugar 642, com nota 5,68.  No ranking de 2009, o primeiro município da RMC a figurar na lista foi Vinhedo (lugar 134, nota 81,69), seguindo-se apenas Americana (142, nota 81,32) com nota superior a 80. Campinas não participou da edição 2009, que teve 566 municípios monitorados. No primeiro ranking divulgado, em 2008, Americana apareceu no lugar 15 (nota 87,17), seguindo-se somente Itatiba (25, nota 84,27) entre os 44 com nota maior que 80. Campinas também não participou da primeira edição do Município Verde Azul, que teve 332 municípios avaliados.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Região de Campinas tem sete municípios entre os 100 de maior PIB: falta avançar ação social e ambiental


Campinas tem PIB municipal maior do que muitas capitais estaduais

A Região Metropolitana de Campinas (RMC) tem sete de seus 19 municípios na lista dos 100 com maior PIB Municipal, conforme estudo divulgado hoje, 12 de dezembro, pelo IBGE. Campinas volta a figurar no décimo primeiro lugar no ranking, à frente de 17 capitais estaduais. O ranking mostra o enorme potencial da RMC na geração de renda e empregos, restando o desafio de avanços nas áreas social e ambiental.
Campinas apresentou um PIB em 2010 de RS 36,6 bilhões, representando 0,97% do total dos municípios brasileiros. O PIB de Campinas é maior do que os de Maceió, Natal e Cuiabá, juntos. Em segundo lugar na RMC aparece Paulínia (no lugar 69 do ranking), com R$ 8,1 bilhões. Em terceiro, Sumaré (lugar 70 no ranking), com R$ 7,8 bilhões.
O quarto lugar na RMC é ocupado por Vinhedo (84 no ranking), com R$ 6,7 bilhões. Em quinto lugar, Americana (86 no ranking), com R$ 6,6 bilhões. O sexto lugar é de Hortolândia (lugar 89), com R$ 6,2 bilhões. E o sétimo lugar é de Indaiatuba (lugar 95), com PIB Municipal de R$ 5,8 bilhões.
Os desafios sociais na RMC podem ser resumidos no fato de que a região conta com 63.613 famílias vinculadas ao Programa Bolsa Família, ou cerca de 240 mil pessoas dependentes de alguma forma do programa social mais conhecido. Números mais do que suficientes para indicar que a RMC, apesar de apresentar bons indicadores em algumas áreas, e de ser uma das mais dinâmicas economicamente no país, ainda tem um déficit social importante, demandando políticas públicas mais ousadas, em aliança entre poder público, setor empresarial e sociedade civil.
Na área ambiental, a região sofre com um déficit hídrico importante, com a reduzida cobertura florestal e poluição atmosférica crescente, agravada por frota de veículos cada vez maior. A região que sedia relevante centro de ciência e tecnologia precisa pensar imediatamente o seu futuro. (Por José Pedro S.Martins)


 


segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

“Juscelininho”, o apelido carinhoso de Niemeyer para o prefeito Toninho, que sonhava com um teatro de ópera no centro de Campinas


Para marcar mais um aniversário de Campinas, a 14 de julho de 2002, o jornal “Correio Popular” publicou um caderno sobre o patrimônio histórico da cidade. Eu não estava mais no jornal, mas escrevi uma matéria especial sobre o convite que o ex-prefeito Antonio da Costa Santos, o Toninho, havia feito para Oscar Niemeyer desenhar o projeto de um teatro para Campinas. Era um dos sonhos mais acalentados por Toninho, assassinado a 10 de setembro de 2001. Naquele que foi o primeiro aniversário de Campinas após essa tragédia, o artigo revelou o apelido carinhoso que Niemeyer deu para Toninho, “Juscelininho”. Abaixo, a reprodução do texto da matéria de dez anos atrás mas com tema tão atual, pois ainda não há perspectiva concreta de construção do teatro:

“Juscelininho” queria um teatro novo. O mago Niemeyer tirou o projeto da cartola

“Calma Juscelininho!” O arquiteto Oscar Niemyer gostava de comparar o seu companheiro de profissão, Antonio da Costa Santos, com o presidente Juscelino Kubitschek, que se projetou na história nacional como o símbolo do período em que o Brasil queria crescer “50 anos em 5″. JK, que governou o país entre 1956 e 1960, tinha pressa, e de seu delírio desenvolvimentista resultou uma das maiores obras da história da arquitetura, a cidade de Brasília, idealizada nas pranchetas mágicas de Lúcio Costa e do próprio Niemeyer.

Pois foi a Niemeyer que o prefeito Antonio da Costa Santos recorreu, para conceber o projeto de um teatro de ópera para o centro histórico de Campinas. A construção de um teatro de grandes dimensões – com capacidade para 1.400 pessoas – para apresentações de peças, shows e outras atividades culturais era um ingrediente estratégico no plano que Toninho havia idealizado para a revitalização do centro da cidade.

Como observa a esposa, Roseana Moraes Garcia, Toninho era um dos campineiros mais inconformados com a perda de dois ítens do patrimônio histórico local, o Teatro São Carlos, derrubado em 1922, e o seu sucessor, o Teatro Municipal, demolido em 1965. O Teatro Municipal havia sido construído em um espaço muito próximo de onde o Teatro São Carlos ficou instalado por por cerca de sete décadas, atrás da Catedral, na atual praça Rui Barbosa.

A edificação de um novo teatro no mesmo local seria praticamente impossível, em função da atual configuração urbanística da área central. Toninho discutiu pessoalmente o assunto em duas oportunidades com Niemeyer.

O prefeito não chegou a ver o projeto pronto. Niemeyer apresentou uma solução após discussões com Marco do Valle, membro da equipe de confiança formada por Toninho para “pensar a cidade”, como gostava de afirmar. A solução encontrada, para a localização do novo teatro de Campinas, foi utilizar a área empregada como terminal rodoviário urbano, entre a avenida Moraes Salles, o Palácio dos Azulejos e as ruas Regente Feijó e José Paulino.

Esta não era a intenção original de Toninho, que pretendia construir um museu multimídia no espaço onde está o terminal de ônibus. O museu também abrigaria os estúdios da rádio e TV municipal. Este foi o único local, entretanto, que acabou viabilizando o projeto de Niemeyer.

Como parte essencial do plano global para o Centro, o projeto arquitetônico do novo teatro municipal foi encomendado diretamente pelo prefeito ao mago Niemeyer. O renomado idealizador dos principais edifícios da capital federal, do complexo da Pampulha em Belo Horizonte e de outras obras fundamentais da arquitetura brasileira teria uma reunião com Toninho no dia 13 de setembro do ano passado, quinta-feira - e não sábado, dia 15, como chegou a ser divulgado. A reunião com Niemeyer, que viria a Campinas nesse dia, havia sido acertada na manhã de 10 de setembro. “Ele estava muito entusiasmado com a visita”, lembra Marco do Valle.

A reunião acabou não acontecendo. Toninho foi morto na noite daquele 10 de setembro – data em que, há 71 anos, era inaugurado o Teatro Municipal de Campinas, sucessor do Teatro São Carlos. Niemeyer ficou muito abalado com o assassinato, mas deu continuidade ao projeto, apresentado em linhas gerais para Roseana, Marco do Valle e outros profissionais. Professor no Instituto de Artes e Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Unicamp, Marco do Valle era a pessoa certa para o contato com Niemeyer. Sua tese de doutorado na USP foi sobre a trajetória do arquiteto: “Desenvolvimento da forma e procedimento de projetos na obra de Oscar Niemeyer: 1935-1998″.

Na tese, Valle mostra como Niemeyer desenvolveu um repertório de formas que acabou utilizando, com releituras e variações, ao longo de sua obra. “O Oscar tem um estilo único de acomodar as construções no terreno, como se elas estivessem pousadas sobre o solo”, observa Marco do Valle.

O professor da Unicamp observa ainda em sua pesquisa como Niemeyer, em sua opinião, desenvolveu um estilo influenciado pela forma de calcular principalmente de dois engenheiros, Emilio Baumgartem e Joaquim Cardoso. Com base nos estudos de cálculo de Baumgartem ele desenvolveu o projeto do Estádio Nacional, que acabou não sendo construído e que seria erguido onde está o Maracanã, no Rio de Janeiro.

Características do projeto estão presentes no Memorial da América Latina, em São Paulo. Sob influência dos cálculos aprimorados por Cardoso, o genial arquiteto concebeu obras como a Igreja de São Francisco de Assis, na Pampulha, com suas incríveis parábolas.

Como mostra a maquete que repousa sobre uma mesa no escritório do arquiteto, em Copacabana, no Rio de Janeiro, o projeto do teatro de Campinas tem algumas dessas marcas pessoais de Niemeyer, um artista sempre polêmico e provocador. As formas ondulantes que o consagraram estão lá, prontas para duelar com retas sóbrias e e repetitivas dos prédios construídos na segunda metade do século 20 no centro da cidade. O projeto exibe uma forma piramidal, mas com lados em curva. O estacionamento seria subterrâneo. Um elevador levaria os visitantes até um foyer que daria acesso ao teatro e a uma galeria para múltiplas exposições.

Não deixou de ser um desafio para Niemeyer idealizar um teatro para um espaço relativamente pequeno como o do antigo terminal de ônibus urbano. Normalmente o arquiteto trabalha com espaços maiores, que permitem maiores alternativas de composição. Mas ele acabou sucumbindo à insistência de “Juscelininho” campineiro, que também parecia ter pressa, como o presidente bossa nova.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Com 240 mil no Bolsa Família, Região Metropolitana de Campinas demanda maior ousadia na área social


Por-do-sol desde o centro de Campinas: região pode ser mais ousada na área social  

Os dados oficiais referentes a novembro indicam que os 19 municípios da Região Metropolitana de Campinas (RMC) reúnem 63.613 famílias vinculadas ao Programa Bolsa Família, ou cerca de 240 mil pessoas dependentes de alguma forma do programa social mais conhecido. Números mais do que suficientes para indicar que a RMC, apesar de apresentar bons indicadores em algumas áreas, e de ser uma das mais dinâmicas economicamente no país, ainda tem um déficit social importante, demandando políticas públicas mais ousadas, em aliança entre poder público, setor empresarial e sociedade civil.
As áreas de vulnerabilidade social da RMC já foram mapeadas pelo Núcleo de Estudos da População (Nepo) da Unicamp, indicando por exemplo os territórios de maior concentração de jovens, demandando políticas públicas específicas. Enfim, existem dados e estudos suficientes para subsidiar as políticas públicas que, espera-se, sejam incrementadas pelos prefeitos eleitos que tomarão posse em janeiro de 2013.
A RMC já foi mais ousada em termos de políticas públicas sociais, tendo sido pioneira em vários campos. Em 1964, quando a região começava a sentir os impactos da explosão demográfica, foi criada a Fundação FEAC, em Campinas. Depois vieram outras ações relevantes, como a criação nas décadas de 1970 e 1980 de organizações não-governamentais cuja missão responde a desafios emergentes, como o câncer infantil (Centro Boldrini), a AIDS (Centro Corsini), entre outros.
Durante o segundo governo de Magalhães Teixeira foi lançado um programa que, para muitos autores, é pioneiro em termos de execução de políticas compensatórias, hoje representadas pelo Bolsa Família, um dos maiores programas do gênero no mundo. Nessa mesma época a FEAC e a Prefeitura estavam juntas no Programa BID, de atendimento a crianças de rua.
Na primeira década do século 21, período em que o Bolsa Família alcançou uma enorme magnitude, as iniciativas locais e/ou regionais diminuíram um pouco o ritmo. Mas a RMC tem total condição de retomar sua vocação histórica e ser mais ousada, mais criativa, para equacionar os dramas sociais, que continuam sérios para muitas, milhares de pessoas. Contribuir para estratégias mais eficazes de desenvolvimento humano integral, em sintonia com os novos tempos, será um desafio de peso para os próximos prefeitos e vereadores na RMC.
Lembrando que em 2013 sairá o novo Índice de Desenvolvimento Humano Municipal, formulado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com base nos dados do Censo 2010. Será uma excelente plataforma para vislumbrar novos rumos para a área social na região que se orgulha de ser uma das mais ricas e avançadas, em termos científicos e tecnológicos, no país.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Professor José Alexandre dos Santos Ribeiro, sobre teatros de Campinas - Parte II (Série Maiores Desafios de Campinas)



Segunda parte do depoimento do professor José Alexandre dos Santos Ribeiro, sobre os teatros de Campinas. Logo após lamentar a demolição do Teatro Municipal Carlos Gomes, no início da década de 1960, ele comenta a saga da transformação do Cine Casablanca no Teatro Castro Mendes, em 1970, na sua gestão como secretário municipal.

SÉRIE MAIORES DESAFIOS DE CAMPINAS 

Professor José Alexandre dos Santos Ribeiro, sobre teatros de Campinas - Parte I (Série Maiores Desafios de Campinas)



Primeira parte do depoimento do professor José Alexandre dos Santos Ribeiro, sobre a trajetória dos teatros de Campinas, desde a inauguração do Teatro São Carlos, em 1850, até sua demolição e construção do Teatro Municipal, inaugurado em 1930. Depoimento ao jornalista e escritor José Pedro Martins, que lhe perguntou sobre o maior desafio de Campinas na área cultural, nas vésperas da posse de um novo governo municipal, do prefeito eleito Jonas Donizette, em janeiro de 2013.

SÉRIE MAIORES DESAFIOS DE CAMPINAS

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Campinas, meu amor, por Zaiman de Brito

Algumas histórias de Zaiman, reunidas em "Campinas, meu amor": tributo à cidade

Um amor imenso, pelas ruas e sua literatura, pelas praças e sua poesia, pelo povo e sua vibração, pela Ponte Preta, a maior paixão. Não é outro o sentimento de Zaiman de Brito em relação a Campinas, desde que aqui chegou, com a mãe, já viúva, a querida Dona Zaíra, e dois irmãos. O fluminense de Macaé se tornou campineiro até os ossos, e um de seus maiores cronistas, com histórias contadas em jornal, rádio, televisão e, agora, internet.

Muitas dessas histórias estão contadas em “Campinas, meu amor – A cidade pelos olhos de Zaiman de Brito Franco”, livro escrito em parceria minha com Helton Pimenta. Livro produzido a partir dos causos que Zaiman contava para Helton na rádio e, depois, televisão. Foi um desafio enorme manter o frescor, tentar reproduzir a magia com que Zaiman faz os seus relatos sobre os bons tempos do restaurante Armorial, do bar Ideal, da boate em frente à Igreja do Carmo.

Histórias povoadas de gente, de gente de verdade, com suas dores, alegrias e esperanças. A renda do livro foi destinada ao Centro Boldrini e ao Centro Corsini, dois exemplos da vocação solidária de Campinas. Abaixo, algumas histórias, pequena amostra do que Zaiman contou e, principalmente, viveu:

O editor pianista – Uma das figuras mais incríveis da boate El Cairo era o pianista, Cataldo Bove. Foi talvez o único pianista e ao mesmo tempo jornalista da história. Ao mesmo tempo não é figura de linguagem. Cataldo editava o jornal, que ficava na esquina das ruas Barão de Jaguara e General Osório e, quando tinha um tempo, corria até a boate para tocar As time goes by ou outra do gosto do público. Tocava e, quando chegava um telegrama urgente, com matéria a ser publicada na edição do dia, corria para o jornal. Às vezes alguém do jornal ligava, pedindo orientação sobre o que fazer com uma matéria que havia ´estourado´, ou seja, era maior do que o espaço previsto para ela na página. ´Corta o pé´, respondia o jornalista do piano.

Bares coladinhos – No Bar Leblon, na área do Largo do Carmo depois conhecida como Praça do Chope, políticos foram servidos várias vezes por um garçom charmoso, boa conversa, que depois virou líder metalúrgico e vereador. Era Cid Ferreira. Ficava ao lado do Bar do Arlindo, o Ponto Chique: se um estava cheio, era só pular para o outro e vice-versa.

Reação – Vila Belmiro. Santos 10 x Guarani 0. Falta apenas um minuto pro jogo terminar quando Augusto, centroavante bugrino, faz o gol do Guarani. Na cabine o saudoso Mário Mellilo, que transmitia a partida, após narrar o gol, renovou as esperanças: “Começa a reação do Guarani…”

Bem caro – Na Copa de 58 não tinha TV. Garoto, Zaiman acompanhou tudo no Largo do Rosário, onde a PRC-9 instalou um balão, que atraiu todas atenções da cidade. O Biné era dono do Giovanetti, o primeiro, em pleno Largo. Terminado o jogo final da Copa, pela primeira vez o Brasil campeão do mundo, o Biné resolveu pagar para chope para todo mundo. Mas pediu para ninguém tomar até ele fazer um brinde. Tinha umas 100 pessoaas no bar e na calçada. Biné levantou o copo para brindar. Mas o copo escapou e foi ao teto. Todo mundo pensou que era para fazer o mesmo e atirou copos com chope e tudo. Biné tomou na cabeça. Foi o chope mais caro da história.

Templo do futebol – Criança, acompanhando a construção do estádio da Ponte Preta, Zaiman ouviu de alguém que aquele seria um “templo do futebol”. À noite, tomando sopa, perguntou para a mãe: “Mãe, o que é templo?” E Dona Zaíra, rápida: “Templo, meu filho, é uma igreja”. O moleque foi dormir pensando, muito preocupado: “Será que a Ponte vai virar uma Igreja?”

Poeminha de Zaiman - “Eu quero um terraço,/ de preferência com goteira./ Onde chova você/ a noite inteira”.

domingo, 2 de dezembro de 2012

Desastres naturais na Região Metropolitana de Campinas aumentam 26 vezes no século 21



Uma das rodovias de acesso a Campinas: região precisa se preparar melhor para riscos de desastres naturais

Inundação brusca ou gradual, movimentos de massa, vendavais e até os temidos tornados. Na primeira década do século 21, os desastres naturais aumentaram 26 vezes na Região Metropolitana de Campinas (RMC), em comparação com a última década do século 20. Os dados estão no Atlas Brasileiro de Desastres Naturais 1991 a 2010, publicado pela Secretaria Nacional de Defesa Civil e fruto de trabalho desenvolvido pelo Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Se ainda existia alguma dúvida sobre como o Brasil já sofre os impactos das mudanças climáticas, elas foram desfeitas pela edição do Atlas, e a situação da Região Metropolitana de Campinas é muito ilustrativa sobre essa constatação. Os dados sobre a RMC ratificam a exigência de maior e melhor preparação da região para a tendência de incremento dos desastres naturais.
Os responsáveis pelo Atlas são claros em alertar que os dados nacionais sobre a ocorrência de desastres naturais na última década do século 20, contidos no relatório (com base nos fatos que levaram à decretação de estado de emergência ou calamidade pública), devem ser vistos com cuidado, considerando "que é sabida a histórica fragilidade do Sistema de Defesa Civil em manter atualizados seus registros". A publicação afirma que o sistema de coleta e interpretação de dados pela Defesa Civil foi muito aprimorado, com a entrada em vigor, na segunda metade da década de 1990, do Formulário de Avaliação de Danos (AVADAN), que substituiu o Relatório de Danos. 
Feitas essas considerações, o Atlas afirma que, "como tendência, é possível apenas afirmar que tanto os desastres têm potencial crescimento, como o fortalecimento do sistema, a fidelidade aos números e o compromisso no registro também crescem com o passar dos anos".
Apesar dessas observações, os dados no Atlas Brasileiro são evidentes ao apontar uma nítida tendência de crescimento da ocorrência de desastres naturais no país nos últimos anos, período em que, segundo a maior parte da comunidade científica, foram fortes os sinais das mudanças climáticas globais. A primeira década do século 21, segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), foi a mais quente registrada desde 1880, superando a década de 1990, que já tinha sido a mais quente até então. Segundo a mesma fonte, a temperatura média mundial aumentou 0,4 graus entre 1992 e 2010 (mesmo período das informações contidas no Atlas Brasileiro de Desastres Naturais).
De acordo com o Atlas, foram registrados no Brasil 23.238 desastres naturais na primeira década do século 21, em relação aos 8.671 desastres registrados na década de 1990. No estado de São Paulo, foram 831 desastres registrados entre 1991 e 2010, a maior parte na primeira década do século 21.

Segundo o Atlas, no conjunto dos 19 municípios da RMC foram registrados 27 desastres naturais nesses 20 anos, sendo 26 na primeira década do século 21. Foram 15 episódios de inundação brusca, o tipo de desastre natural com maior número de registros em território paulista (452, ou 54% dos desastres no estado no período estudado). Com quatro episódios, Sumaré foi o município mais atingido por inundação brusca, seguido de Campinas com três, Monte Mor com dois e Holambra, Indaiatuba, Paulínia, Pedreira, Santa Bárbara D´Oeste e Valinhos, com um episódio cada. O período chuvoso é obviamente aquele com maior número de casos na RMC e em São Paulo: foram 221 casos em janeiro, 117 em fevereiro, 44 em dezembro e 24 em março, em todo estado, provocando 153 mortes, 17 pessoas gravemente feridas, 48 desaparecidas, 485 levemente feridas, 1034 enfermas,  63.653 desabrigadas, 63.133 deslocadas, 92.984 desalojadas e 3.743.793 pessoas afetadas.
O Atlas registra quatro episódios de inundação gradual na RMC, em Americana, Itatiba, Monte Mor e Santa Bárbara D´Oeste. Em todo estado, foram 70 casos de inundação gradual, sendo 50 em fevereiro, 44 em janeiro e 4 em dezembro. Foram 55 casos de inundação gradual somente em 2010.
Foram registrados dois casos de vendaval e/ou ciclone, um em Monte Mor e um em Santa Bárbara D´Oeste, e dois de tornados, ambos em Indaiatuba, sendo um em 1991 e um em 2005. Indaiatuba e Itu lideram, com dois casos cada (em Itu, ambos em 1991), o ranking de ocorrência de tornados em São Paulo no período analisado. Outros municípios paulistas atingidos por tornado foram Capivari, Guapiara, Guaratinguetá, Santo Antônio do Pinhal, Tapiratiba e Turmalina. A região próxima a Campinas, portanto, foi a mais atingida por tornados em território paulista.
Identificados ainda quatro casos de movimentos de massa na RMC, um episódio cada em Americana, Itatiba, Monte Mor e Santa Bárbara D´Oeste. Em todo estado foram 70 casos de movimentos de massa, sendo 45 no mês de janeiro, 16 em fevereiro, 4 em dezembro e 3 em março. Dados mais do que suficientes para aprimorar sistematicamente o sistema de prevenção de desastres, principalmente no período chuvoso que está começando agora. 
Outros dados reforçam a tendência de maior número de desastres no estado, em função das mudanças climáticas. Foram  114 episódios de seca ou estiagem que levaram a estado de emergência ou calamidade pública, a imensa maioria na região Oestes do Estado, sendo 91 em 2005, 15 em 2009, 4 em 2008, 2 em 2006, e 1 em 2004 e 2010. Foram 59 casos de seca ou estiagem em fevereiro, portanto em pleno período normalmente chuvoso.
Provavelmente o número de casos de desastres naturais na RMC tenha sido maior no período abrangido pelo Atlas, e que não foram registrados pelos motivos citados. Mas as informações contidas no Atlas, referentes à região e a todo estado de São Paulo, são suficientes para reforçar a necessidade de aprimoramento sistemático do sistema de prevenção, controle e atendimento a eventuais vítimas na RMC, com planos de contingência muito bem formulados e articulados. Muitos estudiosos afirmam que o mundo caminha para a sociedade da resiliência, marcada pela preparação para enfrentar os riscos e as incertezas, e as incertezas climáticas são uma delas.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Seminário nacional em Campinas dia 30 de novembro debate projetos de sucesso de escolas públicas



Arte no Pátio, na Escola Municipal “Marechal Mário Júlio do Rego”, em Ipojuca-PE, um dos 182 projetos apoiados pelo Instituto Arcor Brasil no Minha Escola Cresce


Será no dia 30 de novembro, em Campinas, o Seminário Práticas Exitosas, que apresentará e debaterá projetos de sucesso de escolas públicas de São Paulo, Minas Gerais e Pernambuco, participantes das nove edições do Programa Minha Escola Cresce, do Instituto Arcor Brasil. No mesmo Seminário, será lançado o Banco de Projetos, com detalhes sobre os 182 projetos de escolas públicas que participaram do Programa Minha Escola Cresce, de 2004 a 2012. Os projetos fortaleceram a diversidade cultural e contribuíram para processos de desenvolvimento local, a educação ambiental e a inclusão de pessoas com deficiência.

      Nas nove edições, foram apoiados projetos em 16 municípios brasileiros apresentados por  escolas de ensino fundamental. Também no Seminário, um consultor em desenvolvimento de redes, grupos e comunidades fará uma exposição sobre trabalho em rede a partir de escolas públicas, proporcionando a melhoria da qualidade do ensino e envolvimento das famílias e comunidades.

      Os projetos desenvolvidos ao longo dos nove anos do Programa Minha Escola Cresce resultaram na montagem e/ou revitalização de mais de 30 bibliotecas escolares, na estruturação de dezenas de oficinas em várias linguagens artísticas (teatro, música, dança etc) e esportivas, no desenvolvimento de mais de 20 projetos de comunicação escolar e em ações voltadas para discutir temas da sustentabilidade em mais de 30 escolas, entre outros impactos. Os projetos foram desenvolvidos de modo a estimular o protagonismo juvenil e incentivar a maior participação das famílias e comunidades na vida escolar. No conjunto, foram projetos direcionados para fortalecer a escola pública.

      O Instituto Arcor Brasil proporcionou apoio técnico e financeiro a todos os projetos,  promoveu oficinas com os educadores envolvidos e visitas técnicas a todas as escolas públicas participantes. No final de cada edição, foram realizados encontros para avaliação dos projetos e intercâmbio de experiências. O Encontro de Intercâmbio da nona e última edição acontecerá dia 29 de novembro, em Campinas.

      Após a troca de informações propiciada por esses encontros, iniciativas de várias escolas acabaram sendo reproduzidas em outras, respeitadas as realidades locais. A ideia do Seminário de Práticas Exitosas é proporcionar, aos gestores e educadores participantes, subsídios sobre como multiplicar projetos em suas respectivas escolas.

     Desde sua criação, em 2004, o Instituto coordena o investimento social do Grupo Arcor no Brasil. Atua em três linhas: apoio a projetos e organizações; geração e divulgação de conhecimentos; e mobilização e incidência pública. Em oito anos de atuação, deu apoio a mais de 330 projetos.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Ampliação de acesso a bibliotecas públicas é um dos desafios de novos prefeitos da Região Metropolitana de Campinas

 
Livro, alicerce civilizatório: essencial


O livro ainda é, e por muito tempo continuará sendo, um dos principais veículos de transmissão do legado cultural de um povo, de uma cidade, e por isso fundamental para a construção da cidadania. A partir deste princípio, os prefeitos eleitos na Região Metropolitana de Campinas (RMC), terão entre seus maiores desafios o de ampliar e aprimorar o acesso às bibliotecas públicas.
Enorme desafio, sem dúvida, considerando os atrativos das novas mídias que, em tese, estariam contribuindo para esvaziar as bibliotecas. Mas as bibliotecas públicas podem ser renovadas, como indicam o Plano Nacional do Livro e Leitura e o Plano Nacional de Cultura. Renovadas e ressignificadas, podem ser cada vez mais espaço de difusão e criação de novos conhecimentos, inclusive com uso das novas tecnologias de comunicação e informação.
Maior atenção para esse elemento representará a contribuição da RMC para o cumprimento da meta 4 do Plano Nacional de Cultura, que trata da elevação da média de leitura nacional para quatro livros lidos por ano fora do aprendizado formal. A média brasileira, de menos de 2 livros por ano, é muito baixa, em comparação com vários países.
Outra meta importante é a 29, que trata da acessibilidade total das bibliotecas públicas (e outros espaços culturais) para pessoas com deficiência. A meta 34, por sua vez, prevê que pelo menos 50% das bibliotecas públicas sejam modernizadas até 2020. Mas a RMC, com o seu perfil, pode alcançar essa meta muito antes. A meta 41 estabelece que todas as bibliotecas públicas disponibilizem até 2020 informações sobre o seu acervo no Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais.
Mesmo sendo uma região metropolitana com renda média muito acima da brasileira, a RMC ainda tem desafios a superar em termos de acesso a bibliotecas públicas.
A RMC conta com mais de 80 bibliotecas, e mais da metade delas está em Campinas, mas a maioria é de organizações educacionais e/ou culturais. O município de Campinas, com cerca de 1,1 milhão de habitantes, tem quatro bibliotecas públicas municipais, das quais uma é infantil e a outra, distrital, em Sousas. Hortolândia tem três bibliotecas públicas municipais, para quase 200 mil moradores.
Em primeiro lugar no ranking (de 2009) do Ministério da Cultura de municípios com bibliotecas públicas abertas para cada 100 mil habitantes está Barueri, com 11 bibliotecas públicas, para mais de 240 mil moradores. Em segundo, Curitiba, com 55 bibliotecas públicas municipais para cerca de 1,9 milhão de moradores.

sábado, 24 de novembro de 2012

Ampliação da Refinaria de Paulínia muda sistema de abastecimento de água da região de Campinas e bacia do rio Piracicaba


Rio Piracicaba: região demanda equidade no abastecimento e qualidade da água

Maior investimento anunciado para o estado de São Paulo, de US$ 4,5 bilhões, o projeto de ampliação e modernização da Refinaria de Paulínia (Replan), da Petrobrás, em fase de implantação, vai transformar o sistema de abastecimento de água da região de Campinas e bacia do rio Piracicaba. Uma das mudanças previstas é a construção de novas barragens para regularizar o abastecimento de água na região e eventual geração de energia elétrica, o que exigirá os devidos estudos de impacto ambiental. Estímulo ao reuso de água e uso de água da chuva, eventual mudança do local de captação de água para Sumaré e ampliação de reflorestamento são algumas medidas previstas para a região (muitas já realizadas) que tem déficit na disponibilidade de recursos hídricos. A disponibilidade de água em vários municípios, principalmente em períodos de estiagem, é equivalente à a de países secos da África e Oriente Médio.
A Replan tinha autorização para captar 1870 metros cúbicos por hora de água (equivalentes a 500 litros por segundo), no rio Jaguari, e a licença para o projeto de ampliação e modernização prevê uma captação de 2400 metros cúbicos por hora (equivalentes a cerca de 660 litros por segundo). O aumento da captação foi justificado pela Petrobrás pela maior utilização da água na produção de diesel e gasolina com baixo teor de enxofre, nos termos do Programa de Controle de Emissões Veiculares (Proconve) e das especificações da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Estão sendo estruturadas unidades de hidrotratamento de diesel e querosene de aviação e de coqueamento retardado, entre outras obras.
O projeto de ampliação e modernização da Replan foi aprovado pelos Comitês das Bacias Hidrográficas dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, que impôs, entretanto, um elenco de condições com dez ítens, começando pelo investimento em reflorestamento nas nascentes da bacia do rio Camanducaia. O plantio de cerca de 200 mil mudas de espécies nativas está em fase de implantação, em Áreas de Preservação Permanente de municípios como Camanducaia, Itapeva, Extrema, Toledo, Vargem, Joanópolis, Pedra Bela, Pinhalzinho, Tuiuti, Bragança Paulista, Morungaba, Monte Alegre do Sul, Amparo, Pedreira, Jaguariúna, Holambra, Santo Antonio de Posse, Artur Nogueira, Cosmópolis e Limeira. O Consórcio Intermunicipal das bacias PCJ foi contratado para realizar estas atividades, que incluem conscientização e mobilização de produtores rurais.
Novas barragens - A segunda condição apresentada pelos Comitês PCJ é a realização de estudos, projetos e obras para aumento da disponibilidade hídrica a montante da captação da Replan, nas bacias dos rios Camamducaia e Jaguari, as duas situadas na bacia do rio Piracicaba. Em função dessa condição, foram contratados estudos para eventual construção de barragens para aumentar a disponibilidade hídrica nessas duas bacias, e esses estudos indicaram sete eixos para implantação de barragens de regularização de vazões e, eventualmente, geração de energia elétrica.
A decisão pela construção de novas barragens na região terá consequencia direta nas negociações para a renovação da outorga do Sistema Cantareira, em 2014. Atualmente, a bacia do rio Piracicaba demanda cerca de 30 mil litros por segundo de água (para usos urbano, industrial e na agricultura) e transfere até 33 mil litros por segundo de água por segundo para abastecer metade da Grande São Paulo. O aumento da disponibilidadade de água na região, com a construção das barragens no Camanducaia (podendo ser transformadas em Pequenas Centrais Hidrelétricas), deve repercutir na renovação da outorga para a Sabesp continuar operando o  Sistema Cantareira, em 2014, com influência então na liberação de água do Cantareira para o abastecimento da região.
A terceira condição tem relação com a segunda, pois trata da realização de estudos de novos mananciais e alternativas de aproveitamento para aumento da disponibilidade hídrica a montante da captação de água da Replan. O estudo já apontou, entre outras alternativas, a viabilidade de construção de seis pequenos barramentos, para atender aos municípios de Amparo, Monte Alegre do Sul, Pinhalzinho, Toledo, Serra Negra, Artur Nogueira, Bragança Paulista, Cosmópolis, Holambra, Jaguariúna, Morungaba, Pedra Bela, Pedreira, Tuiuti e Santo Antônio de Posse.
Outra condição é a realização de estudos para avaliar os impactos das atividades da Replan na qualidade e quantidade dos corpos hídricos.
Mais uma condição é o desenvolvimento de estudos de viabilidade da transferência de captação de água para Sumaré do rio Atibaia para o rio Jaguari, de forma vinculada a ações de aumento de oferta de água na Bacia do Rio Jaguari. Hoje essa captação para Sumaré, no município de Paulínia, está a jusante do lançamento da Replan, o que compromete a qualidade e quantidade de água captadas. Sumaré sofre regularmente com problemas na captação e fornecimento de água para a população. A nova captação para Sumaré seria feita no rio Jaguari, no município de Cosmópolis.
A implantação de estações para o monitoramento da qualidade da água, junto à captação da Replan e de Sumaré, e a realização de pesquisas para identificar o potencial de toxicidade do efluente final e das águas do rio Atibaia na área de influência da Replan foram outras condições, ambas já cumpridas.
Outra condição é a implantação de Plano de Contingência para as bacias PCJ contra acidentes com derramamento de material poluidor nas águas, durante a fase de instalação do empreendimento.O Plano contempla um mapeamento dos riscos potenciais em toda a região, principalmente nas proximidades das captações de água para os municípios.




A nona condição trata de estudos para avaliar o potencial de implementação de práticas de reuso de água e aproveitamento de águas pluviais nas bacias dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí e a implementação do programa de capacitação em reuso da água e armazenamento e aproveitamento da água da chuva na região. O reuso seria feito a partir das águas resultantes do tratamento de esgotos urbanos. Essa água poderia ter uso industrial. Já o estudo de aproveitamento de águas da chuva contemplou ações de educação ambiental  e formação de multiplicadores envolvendo secretarias municipais de educação, diretorias regionais de ensino, diretores e coordenadores de escolas da
Rede Pública de Ensino, educadores, alunos e familiares, técnicos dos Serviços Municipais de Água e Esgoto, técnicos das secretarias municipais de meio ambiente. E a décima condição refere-se ao aprimoramento do programa interno de controle de perdas e racionalização do uso da água na Replan.
Impactos das emissões atmosféricas - A ampliação e modernização da Replan também terá impacto no sistema de emissões atmosféricas na região. A licença ambiental prévia concedida pela Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo prevê a necessidade de plano para controle e redução de emissões atmosféricas, e a instalação em Campinas de uma estação de monitoramento automático da qualidade do ar, em termos de material particulado, NOx e ozônio. "Isto em decorrência do empreendimento ser fonte de emissão de precursores de ozônio, poluente que pode se manifestar em locais distantes das fontes de emissão", segundo a licença concedida pela Secretaria do Meio Ambiente.
A Secretaria também condiciou a licença à apresentação pela Petrobrás de programa de investigação e remediação dos passivos ambientais das áreas objeto do projeto de modernização da Replan. E também solicitou estudos de prospecção arqueológica nas áreas do empreendimento, entre outras exigências. Muitas condições apresentadas pelos Comitês PCJ e Secretaria do Meio Ambiente já foram atendidas e algumas estão em curso, portanto.




sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Em nova edição, Reviva o Rio Atibaia resgata debate sobre importância da APA de Campinas


Sousas, bem perto da captação de água para Campinas: futuro da APA ainda em questão 


Por José Pedro Martins

Neste domingo, dia 25 de novembro, o distrito de Sousas sedia mais uma edição, a de número 15, do Reviva o Rio Atibaia. Atividades a partir das 9 horas, na Praça Beira Rio em Sousas. Realizada poucas semanas antes da posse do prefeito eleito, Jonas Donizette, a nova edição do Reviva o Rio Atibaia contribui para o resgate do debate sobre a importância fundamental da APA para o futuro de Campinas. A proteção da APA (Área de Proteção Ambiental) significa a valorização da vida, uma resposta de Campinas às sérias ameaças contra a biosfera nos tempos atuais.
O processo de criação da APA de Campinas e a trajetória do Movimento Reviva o Rio Atibaia são uma síntese perfeita da mudança de postura em vários segmentos, e em escala internacional, em relação aos rumos do crescimento. Processo iniciado com a Conferência de Estocolmo, em 1972, e que teve a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Eco-92, de junho de 1992, no Rio de Janeiro, como catalisadora, uma alavanca para nova consciência planetária.
No clima criado pela preparação para a Eco-92, em abril de 1991 foi promovido o I Fórum Ecológico de Sousas. Já estava clara, para muitos pesquisadores, ambientalistas e cidadãos campineiros em geral, a necessidade de medidas concretas de preservação daquela região, de grande importância ecológica, cultural e filosófica para Campinas e toda região.
A maior parte do que ainda resta de vegetação de Mata Atlântica no município (menos de 5% do manto verde que cobria originalmente toda a Campinas do Matto Grosso) está situada entre os distritos de Sousas e Joaquim Egídio. São matas que ainda preservam uma rica biodiversidade, em termos vegetais (já foram catalogadas 478 espécies de árvores, além de uma raríssima vegetação rupestre) e animais (475 espécies identificadas, sendo 55 de anfíbios, 39 de répteis, 311 de aves e 70 de mamíferos). Também está localizada em Sousas, desde a década de 1930, a principal captação de água para Campinas.
Já seriam motivos suficientes para a proteção da região, mas ela também sedia um dos principais conjuntos da arquitetura da época de ouro do café. E um outro tesouro ali localizado, o primeiro observatório municipal do Brasil, inaugurado em 15 de janeiro de 1977. O Observatório Municipal de Campinas "Jean Nicolini" é um emblema do olhar amplo da cidade, da sua vocação para ver além, para procurar e construir projetos humanísticos em sintonia com a beleza do cosmos.
Histórico da APA - Pois em novembro de 1991 o então deputado federal José Roberto Magalhães Teixeira apresentou dois projetos de lei, criando as APAs federais de Sousas e Joaquim Egídio. O projeto da APA de Sousas foi arquivado em 1994, mas o de Joaquim Egídio teve continuidade, até arquivamento pelo Senado em 2007 (chegou a receber parecer favorável da senadora Marina Silva). O projeto da APA de Sousas voltou a ser apresentado pelo deputado Luciano Zica, em 1995, sendo arquivado quatro anos depois.
Mas em 28 de maio de 1993 o de novo prefeito Magalhães Teixeira editava o Decreto 11.172, criando a APA Municipal de Sousas e Joaquim Egídio. Em novembro de 1993 a Secretaria Municipal de Planejamento apresentou uma "Proposta Preliminar de Macrozoneamento Ambiental das APAs de Sousas e Joaquim Egídio", que estabelecia cinco macrozonas nos dois distritos. Muitos debates e seminários foram realizados desde então, mas efetivamente a APA, com esta configuração, acabou não sendo concretizada.
Neste cenário surgiu uma grande polêmica, relacionada ao projeto de pavimentação da estrada de terra que liga Campinas a Pedreira, passando por Sousas. Foi a gênese do Movimento pela Qualidade de Vida de Campinas, que passou a questionar o projeto, até que ele foi arquivado.
Nasce o Reviva o Rio Atibaia - O Movimento foi a semente da criação da Jaguatibaia - Associação de Proteção Ambiental, que já em 1997 lançou o Reviva o Rio Atibaia, em parceria com a Associação de Remo de Sousas e Merck Sharp & Dohme. O Reviva retomou o debate sobre a APA. Na segunda edição, em 1998, foi realizado o fórum Resgate do Plano Gestor da APA.
A mobilização se intensificou nas edições seguintes e, a 7 de junho de 2001, durante a Semana do Meio Ambiente, o prefeito Antônio da Costa Santos sancionou a Lei 10.850, criando a APA de Campinas, englobando os distritos de Sousas e Joaquim Egídio e também a região a nordeste do município localizada entre o distrito de Sousas, o Rio Atibaia e o limite intermunicipal Campinas-Jaguariúna e Campinas-Pedreira.
É esta a configuração atual da APA. Em 25 de janeiro de 2002 a prefeita Izalene Tiene editou o Decreto 13.835, criando o Conselho Gestor da APA (Congeapa), já previsto na Lei 10.850. O Plano de Manejo da APA, que vai orientar a ocupação ordenada, sustentável, da região, ainda não foi concluído, apesar da contribuição de profissionais de instituições como Unicamp, PUC-Campinas, Instituto Agronômico e Embrapa Monitoramento por Satélite.
São praticamente duas décadas, portanto, do movimento de cidadania, de ambientalistas e cientistas, direcionado para a proteção e ocupação adequada da área da APA, estratégica em termos ambientais, mas também preciosa em termos culturais, sociais e civilizatórios. Trata-se, então, de um movimento que espelha os desafios encontrados por toda parte do planeta, para se colocar em prática os novos paradigmas propostos pelo movimento ecológico e de sustentabilidade e também pelo setor cultural (a Convenção de Paris, da Unesco, de 1972, trata do patrimônio cultural e natural, não nos esqueçamos!)
Daí a relevância da realização de nova edição do Reviva o Rio Atibaia, neste momento. Definições apropriadas sobre o Plano de Manejo da APA são essenciais para o futuro com qualidade de vida da região. Em 20 anos Sousas e Joaquim Egídio já assumiram um outro perfil, bem distante da realidade do final da década de 1980. E nesse período as estrelas do céu de Campinas ficaram cada vez mais escondidas, pela luminosidade artificial da metrópole. Mas ainda há tempo de um novo tempo.

CAFÉ COM MARCO PADILHA: A SINFONIA DA VIDA


Um café com Marco Padilha, diretor da Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas. Só um café mesmo, para ele, que também tomou uma água sem gás. Eu tomei uma com gás. Ele é o autor do Concerto para Violino e Orquestra e Concerto para Violoncelo, que estão tendo estreia mundial nestes dias 22, 23 e 24 de novembro, na Sala São Paulo, pela Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, tendo o maestro Giancarlo Guerrero como regente e Antonio Meneses como solista.

No começo, um desabafo. “Às vezes não sabemos porque continuamos a fazer o que se gosta. Dá a impressão que nadamos contra a correnteza”, lamenta, se dizendo horrorizado com a “guerra civil” em muitos lugares de grandes cidades brasileiras.

Cita um exemplo muito claro: a Décima Sinfonia de Heitor Villa-Lobos (1887-1959) permanecia quase desconhecida do grande público. Agora será finalmente gravada, em 2013, por iniciativa da Osesp, que está desenvolvendo projeto sobre o grande compositor com o maestro Isaac Karabtchevsky.

Ou seja, sinal de que a música erudita no Brasil ainda precisa caminhar muito. Aos poucos, depois do desabafo, o campineiro Marco Padilha volta a se entusiasmar com o que mais gosta, a música, que exerce ao lado de outra profissão, a de relações públicas, especializado em cerimonial.

Conta que começou tarde. Tinha cerca de 15 anos quando ouviu a Quinta Sinfonia, de Beethoven, em um dos fascículos da Abril. Paixão fulminante, disse para a mãe Ana que gostaria de estudar música. Estudou com Maria Helena Caldatto, depois com Orlando Fagnani e Conservatório Carlos Gomes,, até que foi “adotado” pelo grande José Antonio Rezende de Almeida Prado (1943-2010), que deu aulas na Unicamp por 25 anos.

Padilha formou-se na primeira turma de música do Instituto de Artes da Unicamp, e também cursou Relações Públicas pela PUC-Campinas. Funcionário pela Unicamp, trabalhou com José Aristodemo Pinotti na Secretaria Estadual da Saúde, depois na Câmara e Prefeitura de Campinas.

Duas, ou muitas vidas, em uma. Pausa para um gole de água, ele, de café.

OBRAS PELO MUNDO - Padilha ficou, claro, muito feliz com a encomenda feita pela Osesp. Uma das principais orquestras da América Latina, no principal templo da música erudita no Brasil, com um importante solista. Tudo o que um compositor poderia sonhar.

Padilha tem outros marcos. Várias de suas obras foram exibidas no exterior. Em 1992, ganhou o primeiro lugar em concurso em Zurique, Suíça, com sua composição “Mystagogos” (Mestre dos Mistérios, em grego) Hommage à Olivier Messiaen Op. 14, para flauta- clarinete-violino-violoncelo-piano-percussão. O tema do Festival daquele ano era o Brasil, e o Conjunto Música Nova de Zurique encomentou partituras a 60 compositores brasileiros.

Também teve obra executada pelo violoncelista Antonio Meneses na Fundação Americas Society, em Nova York, e em 2010 em festival em Toulouse, na França. Foi a obra “L´amour, oublier”, inspirada em poema de Paul Verlaine, e que narra a tragédia de uma mulher enlouquecida com um amor que se foi. A peça foi executada, por encomenda, por Les Sacqueboutiers de Toulouse, um grupo de música antiga, e recebeu importantes elogios da crítica francesa. Padilha é o único brasileiro com encomenda feita por esse grupo conhecidíssimo na Europa.

Muitas conquistas, portanto, e o compositor-cerimonialista-relações públicas compartilha o bom gosto pela música erudita no programa Intermezzo, todo domingo, das 19 às 22 horas, na Rádio Educativa, de Campinas. O programa permaneceu durante anos na antiga Rádio Morena. O diretor artístico era Luiz Ceará. Padilha apresentou a ideia, Ceará disse que fariam uma experiência de três meses. Em pouco tempo o programa era líder de audiência em sua faixa de horário e permaneceu por longos anos na emissora.

As garrafas de água mineral estão no fim. Padilha respira e transpira o seu amor pela música. Peço então para ele me indicar cinco músicas, para cinco temas que, acredito, sejam aqueles para sempre fundamentais para o ser humano: Amor, Vida, Morte, Esperança e Desespero. O resultado está abaixo.

No final ele fez questão de acrescentar outro tema: Ilusão.

Esta é a sinfonia da vida, por Marco Padilha, de Campinas.

AMOR – Sonho de Amor – Noturno número 3, de Liszt.

MORTE – Sinfonia das Canções Tristes – Henryk Mikołaj Górecki (o compositor polonês baseou-se na Paixão de Cristo, canções folclóricas e em oração escrita por Helena Wanda Blazusiakowna, polaca de dezoito anos, em 1944, nas paredes de uma prisão da Gestapo, em Zakopane, um dia antes de ser executada).

VIDA – Sinfonia número 3, de Beethoven, conhecida como A Heróica.

ESPERANÇA – Primavera, uma das Quatro Estações, de Vivaldi.

DESESPERO – Noturno Opus 40, de Chopin. (“Momentos angustiantes”, diz Padilha).

ILUSÃO – Carmen, de Bizet (“O protagonista Don José passa a ópera perseguindo a ilusão de um amor e no fim mata esse amor”)

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Campinas terá dois novos centros de alta tecnologia, consolidando o polo da região

Campinas terá em breve dois novos centros de alta tecnologia, com mais um centro de pesquisas da Embrapa e laboratório de uma gigante da área de energia. A região cada vez mais se consolida, portanto, como um dos mais importantes polos de ciência e tecnologia da América Latina. Nestes dias 22 e 23 de novembro, por exemplo, o Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI) está sediando o primeiro encontro de duas redes de pesquisa, uma europeia e outra brasileira, da área de engenharia biomédica, um dos segmentos fortes em alta tecnologia na região.
Campinas já sedia a Embrapa Informática Agropecuária, a Embrapa Monitoramento por Satélite e no início do ano a Embrapa anunciou a criação de um Serviço de Gestão Territorial Estratégico na cidade, com o propósito de prestar serviços de apoio a trabalhos relacionados a zoneamentos ecológicos e econômicos e a planos de manejo de áreas de proteção ambiental. A Embrapa Meio Ambiente está situada, por sua vez, em Jaguariúna.
O laboratório de uma das grandes empresas globais de energia representará mais um salto na consolidação da região como polo de produção e pesquisas energéticas. Em 2010 foi inaugurado em Campinas o Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE).
Nestes dias 22 e 23 de novembro, como um exemplo do dinamismo do polo de C&T de Campinas e região, está sendo realizado no Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI) o primeiro workshop para intercâmbio de informações entre a rede europeia IREBID (International Research Exchange for Biomedical Devices Design and Prototyping) e o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Biofabricação (INCT-Biofabris).
A IREBID visa promover intercâmbios e criar sinergias entre pesquisadores das áreas de engenharia e medicina, objetivando encontrar soluções inovadoras na área da saúde, e é integrada pela Universitat de Girona (Espanha), Instituto Politécnico de Leiria (Portugal), Rutgers - The State University of New Jersey (Estados Unidos), Instituto Tecnológico e de Estudos Superiores de Monterrey (México), Università degli Studi di Brescia (Itália) e o CTI Renato Archer do Brasil.
O INCT-Biofrabris visa fomentar pesquisas em biomateriais, que possam ser aplicadas em dispositivos biomédicos como próteses e em outras áreas da saúde, e sua rede é composta por
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) como instituição sede, Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Instituto de Pesquisas Nucleares (IPEN), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Instituto Nacional de Tecnologia (INT) e o Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI). Outro workshop entre as duas redes acontece nos dias 27 e 28 de novembro.

Seminário lança plataforma para internacionalização de empresas de base tecnológica da região de Campinas a partir da França


José Luiz Guazzelli, cônsul-honorário da França em Campinas, sobre o Seminário Diga Oui à França, Diga Oui à Inovação, que lançou plataforma de internacionalização de empresas de base tecnológica de Campinas e região, a partir da França, dia 21 de novembro de 2012.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Energia renovável em regiões metropolitanas é tema de debate no SESC-Campinas

Quais as perspectivas das energias renováveis em uma região metropolitana como a de Campinas? Como o cidadão pode contribuir para o fortalecimento do uso racional de energia e das fontes renováveis? Questões que estarão em debate na retomada do ciclo Fala mais sobre isso!, no SESC-Campinas, na próxima quarta-feira, 15 de agosto, às 14h30. A convidada é Paula Duarte Araújo Chrestan, doutora em planejamento energético pela Unicamp,  que participou do inventário de gases de efeito-estufa em São Paulo. O Fala mais sobre isso! é um espaço de reflexão sobre temas fundamentais para regiões metropolitanas. A entrada é grátis.
Após a conferência da dra.Paula Chrestan, o Instituto Aqua Genesis estará apresentando "Energia solar térmica - Estudo de caso: Município de São Paulo". Criado em 2006, o Instituo Aqua Genesis é uma instituição sem fins lucrativos, com a finalidade de promover estudos e pesquisas para o desenvolvimento de tecnologias alternativas.
O ciclo Fala mais sobre isso! continuará até novembro, com eventos todas as terceiras quartas-feiras de cada mês. Os próximos temas em debate são as questões das águas (19 de setembro), emissões atmosféricas (17 de outubro) e lixo (21 de novembro).  O SESC-Campinas promove há vários anos debates sobre questões ambientais e sociais, no contexto da região metropolitana de Campinas.  

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Universidade brasileira perdeu um de seus reitores mais corajosos

Por José Pedro Martins



Por que não falamos o que pensamos sobre uma pessoa enquanto ela está viva? Por que a demora, por que o gesto adiado, a confissão tardia? Pois juro que eu gostaria de dizer o que vem a seguir cara a cara, olho no olho, com Elias Boaventura, que morreu sábado, dia 7 de janeiro, aos 74 anos, na Piracicaba que ele – nós – aprendemos a amar tanto.
Eu não sabia quase nada de nada, ou não sabia menos ainda do que não sei, quando me transferi da PUC do Rio para concluir jornalismo na Unimep. Era 1980, finalzinho do regime militar, a ditadura consciente de que ia acabar, mas muitos dos privilegiados por ela não queriam perder suas benesses, seus pequenos reinozinhos conquistados com o sangue de tanta gente.
Inocente de tudo, ou de quase tudo, eu não tinha a menor idéia de que estava prestes a mergulhar no olho no furacão. E que vertigem, e que viagem, e que orgulho por ter vivido aqueles momentos. Piracicaba tinha na ocasião dois visionários no poder. Na Prefeitura, João Herrmann Neto, e como reitor da Universidade Metodista, o mineiro Elias Boaventura, aquele que gostava muito do ditado de sua terra: “Macaco velho não mete a mão em cumbuca”. Dois terremotos, que sacudiram corações e mentes de milhares de jovens como eu na época.
Esses dois caras tiveram a coragem de bancar a realização de dois – não apenas um, mas dois – Congressos Nacionais da UNE, uma das entidades que mais simbolizavam a resistência de duas décadas contra o regime dos generais. Piracicaba tomada, ocupada, por universitários de toda parte, milhões de sonhos represados, quando o movimento estudantil ainda era um espelho de belos, ousados, destemidos sonhos coletivos.
Herrmann propiciou a infra, o metodista Boaventura deu as bênçãos da instituição universitária para os dois congressos, marcados por movimentos como o “Javier é brasileiro” (sobre o presidente da UNE Javier Alfaya, nascido na Espanha, ameaçado de expulsão do país pelos militares). Aldo Rebelo, atual ministro dos Esportes e até ontem protagonista da controvérsia a respeito do polêmico projeto do novo Código Florestal, foi eleito no Congresso de 1980 e recebido ene vezes por Elias na reitoria. Trotskistas do Liberdade e Luta, comunistas do B, filiados e simpatizantes do Partidão, membros do MR-8 do Hora do Povo, todos os grupos que faziam a efervescência do movimento estudantil conviviam, discutiam, negociavam, brigavam e às vezes namoravam naqueles dias vermelhos, verde-amarelos, azuis etc.

Uma festa de utopia, quase abortada pelo atentado no Riocentro, em 30 de abril de 1981, no show para o Dia do Trabalhador. O coronel Dickson Grael, pai de Lars e Torben, e que questionou desde o primeiro momento a versão oficial sobre o atentado no Rio de Janeiro, esteve na Unimep para uma conferência, a convite imaginem de qual reitor? Em 1982, ano das primeiras eleições diretas para governadores depois de duas décadas, novo Congresso da UNE em Piracicaba, com a eleição da primeira mulher para a presidência, Clara Araújo, ligada ao PC do B, enquanto Adelmo Alves Lindo, o "Baiano", que fora presidente do DCE da Unimep, escolhido como vice.
Era impossível sair ileso desse tsunami político que varreu Piracicaba da colina à Rua do Porto. O epicentro era, claro, a Unimep, que vivia um ambiente totalmente favorável ao novo, ao futuro, ao diferente, pela ação pessoal, pela coragem total de Elias, esse profeta de Manhuaçu que talvez não tenha tido, em vida, a valorização que deveria receber no sentido do quanto contribuiu para a redemocratização do Brasil.
Logo que assumiu a reitoria, levou pessoas brilhantes, absolutamente apaixonadas pela justiça, amantes da liberdade sem limites, para trabalhar na Unimep. Nomes como os de Hugo Assmann, Dermi Azevedo, muitos deles que tiveram que se exilar e/ou sentiram na pele o ódio e a violência dos lacaios da ditadura. Mas pessoas que amavam o Brasil, e que também desejavam dias melhores para toda a sofrida e encantadora América Latina.
Era o momento mais fértil, mais fascinante, mais perturbador da Teologia da Libertação. Setores importantes de muitas Igrejas cristãs, a Metodista entre elas, influenciados por essa nova visão de mundo, pela opção preferencial pelos pobres, pela justiça social no centro das prioridades, no topo das agendas públicas. A democracia política não adiantaria se a brutal desigualdade e a violência institucionalizada continuassem em solo latinoamericano.
Alguns dos maiores nomes da Teologia da Libertação, no auge da esperança e da inquietação que provocava (dependendo de onde se estivesse em termos ideológicos), participaram de palestras, cursos ou encontros mais reservados na Unimep. Leonardo Boff entre eles.
Também passaram por ali libertários como Paulo Freire, que nos brindaram com sua inteligência e generosidade (que tristeza que vi nos seus olhos, e outubro de 1983, quando ele abriu o “Estadão” e viu a notícia da execução de Maurice Bishop, presidente socialista de Granada, ocupada – de novo! – por militares norteamericanos, na Operação Fúria Urgente).

Período de fundação da Editora Unimep. "Fé Cristá e Ideologia". de 1981, reproduzindo conteúdo de simpósio com o mesmo tema realizado no mesmo ano, foi um dos primeiros livros editados, com artigos, entre outros, de Jacy Maraschin, Zwinglio Mota Dias, Irma Passoni e Rubem Alves, nomes representativos da renovação do pensamento cristão.
Grande parte da agitação acontecia no campus central da Unimep, naquele tempo em que muitas Universidades ainda tinham pelo menos um de seus campi no centro das cidades onde estão localizadas, no meio do povo, no contato direto com o suor, as tristezas, as dúvidas e as alegrias do cidadão comum, e não como agora, em que majoritariamente estão distantes, geográfica e espiritualmente, das demandas reais das pessoas. O curso de Jornalismo ainda funcionava ali, no campus Centro, e pudemos assim respirar toda aquela magia, aquele frescor de almejados novos tempos.
Só para se ter uma idéia do que era o Jornalismo da Unimep operando nessas condições, nesse cenário singular. Em um determinado período, a Universidade tinha quatro jornais regulares, todos funcionando ao mesmo tempo, para diferentes públicos. O Acontece (informativo que ainda está circulando na Unimep), com notícias do cotidiano da própria Universidade; o Igreja Hoje, com informações sobre o que se passava na ebulição do cristianismo sacudido pela Teologia da Libertação, sempre com uma perspectiva ecumênica; o Jornal Popular, experiência muito incomum, que tinha sua pauta discutida e aprovada por lideranças comunitárias; e aquele que me tocava muito forte, o jornal Opção, um semanário com artigos, reportagens e notícias de atualidades, mas com foco especial na luta dos movimentos sociais, dos leigos e agentes de pastoral comprometidos com mudanças radicais nas estruturas sociais injustas e geradoras de morte.
Como tive o enorme privilégio de trabalhar nessas três últimas publicações, posso não ter a neutralidade suficiente para comentar o que elas significavam, pelo que tinham de diferencial em relação ao que geralmente se produzia em jornalismo universitário. Mas tenho que dizer que foi contagiante, apaixonante, pelo que tinham de material crítico, questionador.
É óbvio que uma movimentação dessas (com a Unimep apoiando e sediando eventos da OLP à Associação dos Favelados de Piracicaba, de solidariedade aos sandinistas da Nicarágua ao movimento das diretas-já, com a presença do deputado Dante de Oliveira) não iria passar desapercebida, incólume aos olhos dos nostálgicos de tempos mais calmos, aqueles da paz dos cemitérios. Elias já havia tido embates com nomes poderosos, como o ministro da Justiça Ibrahim Abi-Ackel, conterrâneo de Manhuaçu.
E a 12 de janeiro de 1985 Elias Boaventura foi destituído, arrancado da reitoria da Unimep por força de um golpe de grupo mais à direita entre os metodistas. Pois não é que a Universidade em peso, ou a grande maioria dela, se mobilizou pela volta de Elias à reitoria? Alguém conhece outro caso de estudantes universitários nas ruas, ocupando o campus, pelo retorno de algum reitor exonerado? Foi o que aconteceu naquela hora, dessas que mexem com os nervos e músculos da gente.
Elias acabou voltando, a Unimep retormou o seu curso revolucionário enquanto ele esteve no cargo. Quando cumpriu o mandato, foi substituído pelo seu vice, Almir de Souza Maia (que também havia sido deposto com Elias), que levou a Unimep, em termos de ensino, pesquisa e extensão, para um alto patamar no conjunto das universidades particulares brasileiras.
Boaventura continuou sua trajetória de disseminador de boas notícias, sempre trabalhando em educação, a plataforma essencial das grandes transformações. Assmann, Herrmann Neto e, agora, Boaventura. Que pena que eles já foram. Mas “não tem problema não, uai”, na frase famosa e muito repetida do eterno reitor, do cristão legítimo, enquanto fazia um movimento circular com a mão direita em direção ao interlocutor. O sonho ainda envolve, aquece e estremece o coração.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Campinas começa 2012 na ONU e com desafio de recuperar ousadia social

Por José Pedro Martins




Neste domingo, primeiro dia de 2012, José Graziano da Silva tomou posse como novo diretor-geral da FAO, o órgão das Nações Unidas para alimentação e agricultura. Chegou ao cargo depois de oito anos como subdiretor-geral e representante da FAO na América Latina e Caribe. Terá como principal desafio, nos quatro anos de mandato, conduzir programas para garantir a segurança alimentar e combater a fome em um mundo que tem 1 bilhão de famintos. Como uma das credenciais para responder ao desafio, o fato de ter sido o coordenador dos estudos de implantação e o primeiro condutor do Programa Fome Zero, como Ministro Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome.

Até 2010 Graziano da Silva foi professor na Unicamp, onde deu aulas desde 1978 e coordenou o Programa de Mestrado e Doutorado em Desenvolvimento Econômico, Espaço e Meio Ambiente do Instituto de Economia. Ainda em Campinas, foi diretor-executivo da Associação Brasileira de Reforma Agrária (ABRA), no período em que a entidade teve sede na cidade. A reforma agrária sempre foi um de seus temas de estudo, desde a publicação, em 1971, do artigo "A Transamazônica e sua Colonização", escrito em parceria com dois alunos da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) e inserido no Boletim Reforma Agrária.

Tomara que a chegada de Graziano da Silva à diretoria-geral da FAO seja um sinal positivo do resgate de Campinas como cidade que historicamente está na vanguarda de muitas questões sociais importantes para o Brasil e o mundo. São vários os casos de pessoas que passaram ou ainda atuam em Universidades locais e que chegaram a assumir tarefas de grande responsabilidade em questões sociais. Vamos citar somente os exemplos dos economistas e professores da Unicamp Luiz Gonzaga Belluzzo e Márcio Pochmann (atual presidente do IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada) e da arquiteta Raquel Rolnik, professora da PUC-Campinas e USP e atual relatora especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU para o direito à moradia adequada.

Campinas igualmente é o local onde prosperaram iniciativas sociais de alta relevância histórica, como a Fundação FEAC (de 1964) e a Assembleia do Povo, uma das principais ações de cidadania no Brasil no período final da ditadura militar. E foi em Campinas, durante o segundo governo de José Roberto Magalhães Teixeira, que foi implantada importante experiência do bolsa-escola, embrião do atual Bolsa Família e que também foi muito discutida desde 1986, sob a liderança de Cristóvam Buarque, na Universidade de Brasília, tendo sido implantada na capital federal no mesmo ano que Campinas - 1995.

A questão é que há anos Campinas perdeu essa ousadia, essa vocação para ações sociais que quebram paradigmas. A cidade que vive um momento político tão conturbado precisa resgatar essa inclinação que faz parte de sua identidade histórica. A esperança é que a posse de José Graziano da Silva na diretoria-geral seja o indicador de novos tempos. O Brasil e sobretudo os moradores de Campinas esperam isso com alta ansiedade. Talvez seja o grande pedido para 2012.