sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Campinas já ultrapassou vários momentos críticos na história e vai superar mais um





Livros do autor, com registros históricos de como

Campinas superou vários momentos críticos


Por José Pedro Martins




A crise política continua rondando Campinas, que chegou a ter três prefeitos em uma semana. Crise prolongada, que é sem dúvida uma das mais graves na história local. Mas não é a única. Essa magnifícia cidade já viveu outros momentos absolutamente graves e superou (quase) todos. Digo quase porque a cidade ainda sente a lacuna deixada por nomes como José Roberto Magalhães Teixeira, Edivaldo Orsi e Antônio da Costa Santos, referências na história recente.
Mas tudo indica que a cidade vai superar mais essa crise. Com união, cidadania ativa, compromisso e sobretudo prática da ética, desejo de transformação e projeto de futuro, Campinas vai retomar o caminho e em pouco tempo de novo voltará ao noticiário nacional por suas realizações, por seu brilho que sempre orgulhou o Brasil. Poucas cidades têm os ativos, o capital social que Campinas tem, para projetar e construir uma cidade de fato saudável e sustentável, na qual todos têm orgulho de viver.
Primeira crise, logo no "parto" - A primeira eleição da Câmara da Vila de São Carlos (nome oficial, porque o local já era conhecido de todos como Campinas, desde a fundação, em 1774, da Freguesia de Nossa Senhora da Conceição das Campinas do Mato Grosso), a 15 de dezembro de 1797, foi o epicentro do primeiro terremoto politico acontecido na cidade. O motivo do conflito foi o fato de que a primeira Câmara, composta por cinco vereadores, se recusou a incluir Raimundo Álvares dos Santos Prado entre os nomes de uma lista tríplice que seria entregue ao capitão-geral (equivalente a governador na época), com os mais votados para capitão-mor, que detinha o poder militar. O poder político local no período colonial e imperial, como se sabe, estava com a Câmara Municipal, seguindo o modelo português. Só com a República foi instituído o cargo de prefeito.
Os chamados "homens bons" de Campinas pagaram caro pela recusa. A primeira Câmara foi deposta, sendo eleita uma nova, empossada a 26 de abril de 1798. A nova Câmara tomou posse, mas a disputa com o governador continuou. Seguidas legislaturas, anuais de acordo com a legislação da época, continuavam resistindo a apoiar o nome de Prado como capitão-mor.
O clima de tensão recrudesceu e, em junho de 1801, o governador Antônio Manuel de Melo Castro Mendonça ordenou a prisão das principais lideranças da política campineira: José Barbosa da Cunha, Francisco de Paula Camargo, Felipe Néri Teixeira, Joaquim José Teixeira e Manuel Teixeira Vilela. Em períodos alternados, as prisões ocorreram de 24 de junho a 4 de outubro de 1801. As lideranças políticas ficaram detidas em Santos.
Os confrontos só foram encerrados com a posse do novo governador, Antônio José de Franca e Horta, a 10 de novembro de 1802. No dia 4 de março de 1804 foi finalmente empossado, pela Câmara da Vila de São Carlos, com capitão-mor, João Francisco de Andrade, escolhido pelos vereadores e aprovado pelo novo governador. Tudo isso ocorrendo quando o crescimento local se devia substancialmente à cana-de-açúcar.
Revolução liberal e febre amarela - A revolução liberal liderada pelo Padre Feijó (que havia residido e trabalhado em Campinas), no início da década de 1840, atingiu em cheio a política local, obviamente. A já cidade de Campinas foi palco do célebre Combate de Venda Grande, a 7 de junho de 1842. O Combate, na altura da atual região dos Amarais, terminou com a vitória das forças governamentais.
Outro momento absolutamente caótico esteve relacionado à epidemia de febre amarela, principalmente no ano de 1889, o ano da proclamação da República tão defendida pelos cafeicultores campineiros - o café já tinha projetado a cidade ao primeiro plano nacional. Durante o período mais crítico, entre fevereiro e junho de 1889, a Câmara de Campinas funcionou de forma precária, pois quem podia saía da cidade quase devastada. O presidente da Câmara, José Paulino Nogueira, foi o líder das ações de atendimento às vítimas e recuperação da cidade, que teve muito apoio da imprensa do Rio de Janeiro.
E de fato Campinas deu a volta por cima e logo estaria de novo na vanguarda de realizações em São Paulo. Muito disso se deveu à atuação do Instituto Agronômico, a organização pioneira do parque científico e tecnológico que seria estruturado na cidade e região.
Século 20 e suas crises - O período republicano não tem sido exatamente isento de crises. No final da década de 1910, Campinas também foi atingida pela Gripe Espanhola, que assombrou o planeta. Em 16 de julho de 1917, a cidade ficou atônita com o Massacre da Porteira da Capivara. Era uma barreira localizada na altura do atual Viaduto Miguel Vicente Cury, na saída da antiga estação da Companhia Ferroviária Paulista. Para impedir os trens de circular durante uma greve, um grupo de ferroviários se instalou nas proximidades da porteira, fato que motivou a repressão de forças policiais, levando a vários feridos e três operários mortos.
A crise de 1929 atingiu o mundo em cheio, levando a mudanças no poder político no Brasil. Com a crise do café, Getúlio Vargas chega ao poder. Novas reviravoltas políticas. A legislatura de 1929-1931 foi suspensa. Tropas federais do general João Franco, que lutavam contra as estaduais de Bertoldo Klinger, acamparam no Bosque dos Jequitibás.
A 18 de setembro de 1932, no meio da Revolução Constitucionalista contra Vargas, Campinas se tornou uma das únicas cidades brasileiras bombardeadas por avião até o momento. Quatro bombas foram lançadas contra o parque ferroviário de Campinas, e uma delas feriu quatro pessoas e matou o menino Aldo Chiorato, de 9 anos. A infância vitimada por conflitos.
Entre 1937, o ano do golpe do Estavo Novo, e 1947, não houve eleições municipais. Mas os prefeitos e conselheiros nomeados do período continuaram a organizar a cidade, como o novo sistema de captação de água no rio Atibaia e várias ações que ajudaram a estruturar o parque industrial, com o qual a cidade se recuperou da crise do café (além do algodão e outras culturas estudadas pelo IAC).
Depois de 18 anos de um período de instabilidade política e de exceção, foram eleitos uma nova legislatura e um novo prefeito, tomando posse em 1948. Campinas foi um dos cenários da grande euforia desenvolvimentista dos anos 1950, coincidindo com os Anos JK. A PUC-Campinas, inaugurada em 1941 a partir da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras criada pela Sociedade Campineira de Educação e Instrução, mantida pela Diocese, e depois a Unicamp, no início dos anos 60, foram os novos pilares do parque científico e tecnológico.
O mundo acadêmico foi uma das trincheiras locais contra a ditadura militar instalada em 1964 e que inaugurou novo período de instabilidade política. Campinas "explodiu" nos anos 60 a 80, em termos populacionais, com crescimento médio muito superior à média paulista e brasileira. Mas a cidade continuava brilhando, com avanços como a formação da Fundação FEAC, unindo as entidades sociais, em modelo único no país.
Veio a escalada da violência na década de 1990. E o período de sucessivas crises políticas na história local, desde a morte do prefeito José Roberto Magalhães Teixeira, em fevereiro de 1996, tendo assumido o vice, Edivaldo Orsi. Depois vieram os polêmicos governos de Chico Amaral e Izalene Tiene, esta, tendo assumido como vice de Antônio da Costa Santos, assassinado a 10 de setembro de 2001. Mesmo com toda dor e tristeza, a cidade continuou crescendo, atraindo novos centros de ciência e tecnologia, entre outras realizações.
Momento para pensar o futuro - E a atual crise, com três prefeitos (Dr.Hélio, Demétrio Vilagra e Pedro Serafim) em uma semana em agosto. Agora a volta de Demétrio Vilagra (PT), depois de rápida passagem de Pedro Serafim pelo poder. A cidade tem, enfim, novo grande, imenso desafio, de voltar a recuperar a autoestima e se reerguer.
Momento excepcional para repensar o próprio crescimento físico local. Quais os limites ambientais desse crescimento? Como implantar um desenvolvimento de fato sustentável, efetivamente inclusivo, e não somente crescimento econômico e populacional? Quais as prioridades? Como impulsionar a qualidade na educação básica? Perguntas que serão respondidas com um projeto coletivo, intersetorial, lastreado por uma cidadania ativa e profundo sentimento de justiça, ética e responsabilidade.
Os exemplos de momentos críticos históricos mostram que Campinas pode, deve e vai superar mais uma fase profundamente crítica. Lembrando que crise, em sua raiz grega, tem justamente o sentido de oportunidade de mudança, de metamorfose, de apontar para o novo. E, por causa da febre amarela, Campinas não recebeu como símbolo a Fênix, a ave da mitologia grega que renasce das cinzas? (Com informações dos livros "Câmara em Foco - Os 200 anos do Poder Legislativo em Campinas", de 1998, "Campinas Século XX - 100 anos de história", RAC, 2000, e "Campinas, Imagens da História", Komedi, de 2007, do autor do artigo)

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