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quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Congadas de Itamogi, Paraíso e região têm raízes negras e europeias

 
Congadas em Itamogi, Minas Gerais: hierarquias se desfazem como pó


Tchi, tchi, tchi, tchi, bum, tchi, tchi, tchi, tchi, bum. O som da caixa é inconfundível e serve de senha. O terno de congo está chegando com sua miscelânea de cores, sons e ritmos, mesclando os valores culturais e religiosos vindos da mãe África, a bordo dos tristes navios negreiros, com os valores católicos trazidos pelos portugueses.  Uma das mais importantes manifestações que contribuíram para firmar a mestiça identidade nacional, embora não tão valorizada e lembrada como o samba ou a capoeira, as congadas estão esparramadas por todo o Brasil,  acontecendo, aqui e ali, em determinada  época do ano e celebrada com características próprias, dependendo das peculairidades regionais que adquiriram.
As origens das congadas são matéria de controvérsia entre pesquisadores. Uma corrente identifica sua fonte em uma tradição africana, em torno da coroação dos reis do Congo, embora outroas vertentes acreditem que a matriz esteja em Angola. De qualquer modo, a tradição, de tão forte, atravessou o Atlântico e se instalou no coração das senzalas, dos quilombos e de outras comunidades negras no período colonial. Em terras brasileiras, seria uma forma de os escravos reafirmaram suas origens, sua identidade, sua fidelidade aos antepassados.
Como ocorreu com outras expressões culturais e religiosas, as Congadas evoluíram em função do sincretismo que proliferou no período colonial e monárquico. Às raízes africanas foram somadas  as influências católicas europeias e as congadas passaram a se tornar momentos de homenagem a santos de grande simpatia e empatia populares, como Nossa Senhora do Rosário e São Benedito.
Depois vieram os cultos, durante as congadas, a outros santos queridos, como Santa Ifigênia, Santa Catarina, São Jerônimo e São Domingos. Ecos de tradições europeias também são ouvidos em algumas sonoridades e no enredo das Congadas, que teriam incorporado situações ligadas aos reis Fernando e Isabel, da Espanha,  e/ou de Carlos Magno e os 12 pares da França, ou mesmo as cruzadas contra os mouros na Península Ibérica. De fato, existem traços de combates simulados em algumas modalidades de Congadas, em referência às fontes africanas ou europeias.
Sons fortes, batidas pesadas, marcam o compasso dos ternos, os grupos que se reúnem para desenvolver as Congadas. São os sons vindos dos pandeiros, cuícas, reco-recos e, sobretudo, das caixas de congo, espécie de tambores que geralmente vão à frente dos ternos. Impossível não se contagiar com os batuques que evocam o imaginário mestiço, plurirracial, que moldou a alma brasileira. Mas instrumentos de corda também estão presentes, compondo uma sinfonia de sons e ritmos que convida para a dança, inclusive em algumas festas do Divino, nas quais estão presentes modalidades de Congadas.
Em todos os pontos do Brasil, onde as Congadas continuam firmes, resistindo à massificação cultural,  as festividades cumprem papel semelhante ao do Carrnaval. São momentos de celebração da liberdade e da vida, como ocorria nos eventos originais - os senhores de engenho davam "permissão" para os escravos celebrarem o cortejo dos reis congos durante um dia específico. Era, óbvio, uma data muito esperada e comemorada. As celebrações também dependiam, no caso de ocorrerem  em espaços urbanos, da autorização das autoridades policiais.
As Congadas contemporâneas mantêm, em linhas gerais, o enredo das fontes. Os "congadeiros" cantam as músicas em louvor aos santos, dançam passos com nítida inspiração africana e, em determinadas ocasiões, fazem o transporte dos reis congos, um casal que é escolhido como "majestades" para liderar as festividades. Os reis congos são então acompanhados pelas ruas até sua entrada nas igrejas. Geralmente os reis congos, devidamente vestidos com indumentárias brilhantes, são abrigados sob guarda-chuvas ou outros aparatos protetores. Tudo para salientar a sua realeza. A coroação dos reis congos é momento forte.
Outro momento forte dos cortejos é o das chamadas "embaixadas", que seria uma referência às embaixadas enviadas entre as cortes africanas - embaixadas de paz ou de guerra. Não por acaso, os ternos são geralmente conduzidos sob a batuta de "generais" e "capitães", além, é claro, dos próprios reis congos. Em algumas localidades também acontece o levantamento das bandeiras em homenagem a determinados santos, que se constitui na solenidade que abre oficialmente as congadas daquele ano. Com efeito, as festas das Congadas apenas são encerradas, nesses locais, quando acontece a descida das bandeiras, que ficam instaladas no centro nervoso onde ocorrem as festividades.
Existem Congadas espalhadas por todo o território brasileiro, mas em algumas comunidades elas adquiriram força especial, atraindo a cada ano os moradores locais e também turistas. São os casos de Pirenópolis e Catalão, em Goiás, de Cametá, no Paraná, e de várias cidades mineiras, como Uberlândia, São João del-Rei, Machado, São Sebastião do Paraíso e Itamogi. Desses locais, em especial do sul de Minas, as Congadas foram levadas pelos migrantes mineiros que se estabeleceram nas periferias de grandes cidades, como São Paulo e Campinas. O tradicional Festival do Folclore de Olímpia, no interior paulista, é um momento especial de apresentação de congadas de todo país.
As Congadas incluem, de acordo com a tradição, a apresentação de grupos com funções específicas, como os vilões, os marujos, os catupés, os próprios congos e os moçambiques. Os moçambiques, em particular, seriam os "anjos" que abriam caminho para os acompanhantes dos reis congos. Em algumas regiões, os moçambiques passaram a constituir "ternos", ou grupos próprios, como em São Sebastião do Paraíso e Itamogi, no Sul de Minas. Nesses casos, a indumentária dos "moçambiqueiros" difere dos "congadeiros". Os "moçambiqueiros" são trajados de saias e portam espécies de guizo nos pés, acentuando sua sonoridade própria durante as danças e cantos.
Como em toda grande festa de caráter popular, cultural e religioso, as congadas também são sinônimo de culinária pesada. Em algumas localidades permanece a tradição de oferecimento de farta comida e generosa bebida por parte dos "festeiros", pessoas das comunidades que assumem esse encargo. Em outros locais essa tarefa passou à esfera do poder público, com muita, mas muita comida servida, e de graça, para quem quiser. Em Itamogi, a macarronada com batata é servida com muita generosidade para os "congadeiros", os "moçambiqueiros" e o povo em geral, nos quatro dias da tão esperada festa, que é o emblema da identidade local.
A exemplo de outras legítimas manifestações culturais e religiosas, as Congadas também sofreram mutações inevitáveis em função das mudanças profundas na sociedade brasileira,  como no caso da transição de um mundo essencialmente rural para um universo urbano. Para muitos as raízes estão perdidas no passado, ameaçadas por interesses políticos e econômicos que passaram a envolver muitas das festas da alma brasileira. Mas os sinais originais, os ecos da Mãe África e igualmente das influências europeias, continuam presentes, sempre a encantarem e a seduzirem pelo mosaico de sons, ritmos, cores e sabores que ainda vestem, com realeza e fidalguia, as Congadas, momento mágico em que as hierarquias se desfazem como pó.  (Texto do livro "Imagens do Brasil - A alma plural e única do Brasil", Volume 1, de José Pedro Soares Martins, Editora Komedi, Campinas, 2010)

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Congadas e moçambique, patrimônio imaterial em Paraíso: decisão histórica

A decisão de tornar as Congadas e o Moçambique como Patrimônio Cultural Imaterial de São Sebastião do Paraíso pode ser classificada de histórica, abrindo perspectivas para um fortalecimento ainda maior dessas manifestações culturais em toda a região. A deliberação é do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural, e foi tomada no início de outubro.
O conceito de patrimônio cultural imaterial vem sendo defendido desde 1989 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco). A idéia foi uma evolução da Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural, de 1972.
Por essa Convenção, conjuntos arquitetônicos históricos, merecedores de proteção especial, têm recebido o título de Patrimônio Cultural da Humanidade. Casos de Ouro Preto e Brasília, entre outros, no Brasil. Do mesmo modo, locais naturais de grande relevância ecológica também têm merecido o título de Patrimônio Natural da Humanidade, como o Parque Nacional do Iguaçu (abrangendo Cataratas do Iguaçu) e parte do Pantanal.
Pois a Unesco, desde a década de 1980, também vem discutindo a idéia de considerar importantes manifestações culturais como patrimônio imaterial. Uma forma de estimular a sua proteção e preservação para as gerações futuras.
Em 1989 a Unesco publicou a Recomendação para a Salvaguarda da Cultura Tradicional e do Folclore. Foi o ponto de partida oficial para a discussão sobre o patrimônio cultural imaterial. Em 2003 a Unesco promoveu a edição da Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial.
Por esta Convenção, patrimônio cultural imaterial seria o conjunto de "práticas, representações, expressões, conhecimentos e aptidões - bem como os instrumentos, objetos, artefatos e espaços culturais que lhe estão associados - que as comunidades, os grupos e, sendo o caso, os indivíduos reconheçam como fazendo parte integrante do seu patrimônio cultural".
Em função dessa definição, seriam então considerados típicos de patrimônio cultural imaterial "tradições e expressões orais, incluindo a língua como vetor do patrimônio cultural imaterial; artes do espetáculo; práticas sociais, rituais e eventos festivos; conhecimentos e práticas relacionados com a natureza e o universo; e aptidões ligadas ao artesanato tradicional".
Após a publicação dessa Convenção da Unesco, foram multiplicadas as iniciativas de proteção do patrimônio cultural imaterial em todo planeta, e no Brasil não tem sido diferente. Ora, as Congadas e o Moçambique, e também as Folias de Reis, são algumas das mais importantes expressões da cultura afrodescendente no Brasil. E na região, essas manifestações são particularmente fortes em São Sebastião do Paraíso, Itamogi e Santo Antônio da Alegria.
Essa decisão de São Sebastião do Paraíso pode ser, assim, o ponto de partida para um grande movimento de fortalecimento, valorização e proteção ainda maior das Congadas e Moçambique na região. E desde já o BELA REGIÃO lança a campanha por tornar as Congadas e Moçambique, e também as Folias de Reis, da região como Patrimônio Cultural Imaterial Estadual, nos casos de Minas Gerais e São Paulo. Congadas e Moçambique são a vida da região, pulsando no coração de cada um de seus moradores e daqueles que nela nasceram. (Por José Pedro S.Martins)

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Livro cita congadas de Itamogi, Paraíso e região


Capa do Volume 1 de Imagens do Brasil

As congadas de Itamogi, São Sebastião do Paraíso e região são citadas em "Imagens do Brasil", meu novo livro, da Editora Komedi, que estou lançando hoje em Campinas. Lançamento na Livraria Saraiva, do Shopping Iguatemi, a partir das 19 horas. Na realidade é uma obra em dois volumes: "A alma plural e única do Brasil" e "Alma regional do Brasil". Fotos de Adriano Rosa e vários outros fotógrafos, de diversas partes do país.


No primeiro volume, trato das manifestações culturais típicas que ocorrem em todo território nacional, claro que com as devidas diferenças regionais. Caso das próprias congadas, que também acontecem em São Paulo e outros estados. Casos ainda do carnaval, das festas juninas, da capoeira, o samba, o futebol e por aí vai.


No segundo volume, comento as manifestações culturais que são características de uma determinada região, e que geralmente têm muito a ver com o meio ambiente, com a natureza, dessa região. A região amazônica, por exemplo, é o palco do Festival de Parintins e do carimbó. O Nordeste do semi-árido e do agreste é a terra do cordel, da culinária típica, do axé, do frevo e tantas outras belezas e delícias.


O Centro-Oeste e o Pantanal, por sua vez, são o cenário perfeito para as cavalhadas, os mascarados. No Sudeste, o samba urbano, o cururu de Piracicaba. E no Sul, a marejada em Santa Catarina, a chula no Rio Grande do Sul e outras expressões locais. Um retrato, enfim, da alma plural e única mas também regional do Brasil. A nossa cultura é de uma impressionante diversidade por isso, pelas diferenças regionais, pela mescla de etnias.


Sobre as "Congadas, os tambores da mãe África", presentes em Itamogi, Paraíso e em toda região, afirmo: "Uma das mais importantes manifestações que contribuíram para firmar a mestiça identidade nacional, embora não tão valorizada e lembrada como o samba e a capoeira, as congadas estão esparramadas por todo o Brasil, acontecendo, aqui e ali, em determinada época do ano e celebrada com características próprias, dependendo das peculiaridades regionais que adquiriram".


Depois de descrever a história, a trajetória, a culinária e outros pontos associados às congadas, concluo: "... os sinais originais, os ecos da mãe África e igualmente das influências européias, continuam presentes, sempre a encantarem e a seduzirem pelo mosaico de sons, ritmos, cores e sabores que ainda vestem, com realeza e fidalguia, as congadas, momento mágico em que as hierarquias se desfazem como pó". Seria um prazer a presença de todos no lançamento.


O meu coração bate no ritmo das caixas de congo. Meu grande abraço, bela região. (José Pedro S.Martins)











sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Congadas em Santo Antônio, o som do coração do Brasil

Igreja de Nossa Senhora do Rosário, um dos símbolos das Congadas em Santo Antônio da Alegria
Começa nesta sexta-feira, 3 de setembro, a Festa do Congo de Santo Antônio da Alegria. Vai até segunda-feira, dia 6, e nesse período Santo Antônio se torna a capital nacional das Congadas, com a participação de ternos de Congo, Moçambique, Caiapós e Catupé do município e de vários estados brasileiros.
O levantamento das bandeiras já tinha ocorrido, a 22 de agosto. Agora as Congadas na Cidade Folclore, como Santo Antônio é conhecida, em homenagem aos santos patronos: Nossa Senhora do Rosário, Santa Catarina, São Domingos, São Benedito, Santa Efigênia, São Roque. As atividades serão na praça José Ayub Calixto.
Para muitos historiadores, as Congadas brasileiras são derivadas da coroação do rei do Congo, embora também se acredita que o berço tenha sido Angola. O fato é que a tradição atravessou o Oceano Atlântico e, a partir das senzalas, ganhou os corações brasileiros, como uma afirmação de identidade.
No Brasil, as Congadas ficaram marcadas pelo sincretismo religioso, que mesclou os valores e crenças cristãos e aqueles de origem africana. O culto aos queridos santos, como os patronos das Congadas de Santo Antônio da Alegria, tornou-se outra marca das festividades em território brasileiro.
Música, cultura, fé e devoção fazem, então, a base das Congadas. E não podem faltar as deliciosas comidas, os quitutes produzidos por homens e mulheres que passam a madrugada preparando os pratos. As Congadas em Santo Antônio da Alegria, e também as de Itamogi e São Sebastião do Paraíso, são verdadeiros alimentos para a alma, um momento de comunhão de afetos, de reafirmação do pertencimento a uma comunidade. São pão para o espírito.
Meu grande abraço, bela região. (José Pedro S.Martins)